9 de julho de 2011

A nossa Guerra

Silêncio. Escuridão. A respiração está ofegante. Encolhido, parece um animal acuado. Clarões rasgam o céu, mas não é fim de ano. Explosões. Gritos. Choro. Silêncio. E assim acontece de novo, de novo, de novo e de novo. O cheiro de morte impregna-se em suas narinas. A agonia em forma de sons ecoa em sua mente.
Ele está sozinho. Ficar ali na trincheira não é o que deseja. Talvez devesse sair correndo como um louco. Talvez devesse se esconder até que tudo acabasse. Talvez, Talvez, Talvez... “Talvez” não adianta nada. Perguntas demais, respostas desnecessárias. Ele sabe o que fazer. Mas a sensação de impotência é grande demais.

Barulho, diferente. Muito perto. Se aproximando. Respiração tão falha quanto a sua. Sem opção, um sussurro:

-Amigo ou Inimigo

A resposta que o tira o folego:

- IRMÃO!

Já havia tanto tempo que não escutava esta simples palavra. Pensava até que todos que poderia chamar assim estariam mortos. Alguns simplesmente só fingiam, eram na verdade usado pelos inimigos apenas. A cada dia que passava a certeza de que nunca mais se encontraria com um destes, muito mais do que simples amigos. Lágrimas, que a escuridão tratou de esconder.

- Vem sozinho?

- Agora sim, mas tenho mais alguns que vem logo atrás. Eu só vim ver se tava tudo limpo, pra prepararmos.

O entusiasmo inicial foi trocado por uma preocupação, certo desanimo.

- Não perca seu tempo, e de seus companheiros que vem para cá, aqui não é lugar para se esconder. Não tem para onde correr. A coisa nunca esteve tão feia desses lados. “Os Outros” já dominaram quase todos que estavam por aqui. Toda hora bombas explodem, tiros cruzam o céu. Vá embora enquanto pode, pra se esconder não adianta vir...

- Meu irmão, que ainda nem sei o nome, não pretendo me esconder, muito menos fugir. Vim aqui lutar. Sabia que encontraria alguém aqui, nesta terra. Acha que cheguei aqui por acaso? O caminho foi longo. Mas não estou atrás de descanso. Como posso ir dormir com tanta merda acontecendo aqui?

Não há tempo nem para apresentações. Nomes são meros detalhes. Ele fica sabendo que em alguns instantes o resto do grande pequeno exército estaria chegando. Sua euforia era nítida. Os poucos raios de luz que vinham da Lua mostravam, mesmo que de relance, um sorriso. Há anos não sabia o que era além de chorar e gritar. Começa a arrumar a trincheira, preparar para que possam ficar ali, esperando, quando é interrompido:

- O que está fazendo?

- Preparando a trincheira, temos que estar preparados pra quando vierem nossos inimigos.

- Já não te falei que não vim me esconder?

- Já, mas é que encarar de frente, assim? Não é arriscado? Perigoso?

- Claro que é. Mas meu medo não é tão grande quanto à vontade de achar aqueles que estão perdidos em meio a está guerra, tirá-los dessas trevas.

- Mas...

- Olhe ao seu redor. Está há tanto tempo no meio dessa desgraça que não se incomoda mais, mas repare. A indiferença já tomou conta de todos. A fome está tirando vidas como doce da boca de criança. A depressão ataca todos os dias, mas são espertos, se infiltram, e dominam aos poucos.

A solidão é envolvente. Veja, ali, as drogas estão atirando, as balas atravessam o peito, e acertam até quem não tem nada a ver com a história. A prostituição, a imoralidade, como um fungo, se apossa dos corpos destes jovens, subindo-lhes dos pés a cabeça, abrindo feridas em suas almas, em seus corpos. Todos foram cegados, com loucos andam se apoiando em sua vã sabedoria. Mas nada, NADA, supera o que tem destruído famílias inteiras de uma vez, arruinados vidas promissoras, levado a tanta desgraça, ódio, choro, tristeza, medo: a falta de AMOR.

Lágrimas. Vergonha. Inconformado. Incredulidade em tanta desgraça. Como pode passar tanto tempo sem perceber como tudo realmente estava? Como também havia permitido que o frio entrasse por sua blusa e tomado conta de seu coração.

A tropa chega. Eles são estudantes, filhos, pais, maridos, namorados, trabalhadores, altos, baixos, são assim, simplesmente soldados. Em seus olhos não se vê medo. Não há hesitação. É possível sentir a paz em seus corações a quilômetros de distância. Alguns não passavam dos seus 19 anos. Outros com seus 60 anos. Não há fracos. Suas forças não depende de seus músculos. Seu general não é um mero mortal.

- Meu irmão, se junta a nós?

- Como não me juntaria? Agora que eu vi sou responsável. Não terei sangue inocente em minhas mãos.

- Então saiba, a nossa luta não é contra pessoas, mas contra os poderes e autoridades, contra os dominadores deste mundo de trevas, contra as forças espirituais do mal nas regiões celestiais.

- E nossas armas, cadê? O que vamos fazer?

- Nosso objetivo é fazer a diferença, nossa arma é o AMOR.
Posição de ataque. Colocam sua armadura, de joelhos no chão, olhos para o céu, lábios a orar. Em pé.

- Deus abençoe a todos nós. Somos um povo corrompido vivendo sob a mira de uma arma carregada. Não podemos ser combatidos. Não podemos ser superados. Não podemos ser dominados. Não podemos ser vencidos.

Eles partem para a guerra, de cabeça erguida, sabendo que viver, só para Cristo, morrer, é lucro, e a certeza, de que a vitória já foi conquista lá na cruz. 
 
Escrito por: Calebe Paranhos
Fonte: http://www.juventudenarocha.com/2011/07/nossa-guerra.html

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